O Museu Casa da Moeda conta-lhe a história de Portugal com base numa seleção de moedas cunhadas no país entre o século XII e os nossos dias. Trata-se de uma exposição temática que mostra ao público uma seleção exclusiva de moedas de ouro representativas de cada século da história nacional. São, no total, 10 moedas que contam a história do primeiro “milénio português”, do morabitino de D. Sancho I ao euro da República Portuguesa.
Armado cavaleiro pelo pai após o desastre de Badajoz, D. Sancho I procurou consolidar a fronteira com a Galiza, a norte, e continuar a guerra com o islão, a sul, tendo conseguido conquistar a cidade de Silves, um dos bastiões da presença almóada no Gharb al-Andalus, com o apoio de uma frota que seguia para a cruzada do oriente. Selada a aliança com Aragão e Roma, D. Sancho I dedicou a sua atenção à organização do povoamento e do território, fundando cidades como a Guarda ou concedendo cartas de foral às já existentes, em especial na Beira e em Trás-os-Montes. A moeda que marca o seu reinado, o morabitino, a primeira moeda de ouro cunhada em Portugal, apresenta todas as caraterísticas de uma peça produzida para uma monarquia cristã, apesar de o seu nome ser de origem árabe.
No século XIII, D. Sancho II deu continuidade à política de emissão em ouro que tinha sido desenvolvida pelo pai, D. Afonso II, e ordenou a cunhagem de um novo morabitino, moeda que já circulava nos cofres do reino desde os finais do século XII. À semelhança da anterior, esta moeda foi batida num momento importante da história de Portugal, marcado, por um lado, pela guerra com o islão, na qual se destacou a Ordem de Santiago; por outro, pelos conflitos com o clero, em especial o arcebispo de Braga e os bispos de Lisboa e Porto; por fim, pela guerra civil que opôs o rei ao irmão mais novo, D. Afonso, que terminaria com a sua própria deposição.
A crise que atravessou a Europa durante o século XIV, de que a peste negra foi talvez o episódio mais marcante, também se fez sentir em Portugal. O reinado de D. Fernando foi muito turbulento: travaram-se guerras a propósito do trono de Castela e alguns setores populares reagiram negativamente ao casamento do rei com D. Leonor Teles de Meneses. Restabelecida a paz social, D. Fernando dedicou alguma atenção à administração do reino: ordenou a construção ou a reparação de vários castelos e muralhas, como em Lisboa e no Porto; promulgou a lei das sesmarias, com a qual procurou fomentar a agricultura; alargou as redes comerciais com o estrangeiro e promoveu o desenvolvimento da marinha.
A morte do rei, sem descendência, abriu o caminho à regência de D. Leonor, apoiada pelo rei de Castela, e à oposição de alguns setores da sociedade, que se organizaram à volta de D. João, mestre de Avis: a crise dinástica instalou-se entre 1383 e 1385. Apesar disso, foi durante o reinado de D. Fernando que se assistiu a uma grande diversificação das espécies monetárias que circulavam no território português, sinal de uma economia que procurava revitalizar-se a todo o custo. Data desta época a cunhagem da dobra pé-terra, em que o rei, influenciado pela moeda francesa, se faz representar de pé, coroado e couraçado, segurando uma espada na mão e o escudo com o brasão de armas do reino na outra, enquadrado por um cenário tipicamente gótico. Na outra face surge uma cruz equilateral ricamente ornamentada segundo o modo gótico. Os letreiros dizem “Fernando, por graça de Deus, rei de Portugal e dos Algarves.”
No século XV, a coroa portuguesa deu passos decisivos na exploração do território africano: dando continuidade à ação do infante D. Henrique, D. João II centralizou na coroa o comércio do golfo da Guiné e da costa da Mina, ao mesmo tempo que incentivou as explorações que levaram à descoberta da foz do rio Congo por Diogo Cão, a travessia do Cabo da Boa Esperança por Bartolomeu Dias e as expedições de Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva à terra do preste João. Outro acontecimento muito importante foi a assinatura do Tratado de Tordesilhas, com o qual os monarcas ibéricos acordaram a divisão do mundo entre Portugal e Espanha, fixando as respetivas áreas de jurisdição.
Esta imagem do poder régio é complementada pela presença do brasão de armas do reino, símbolo da soberania nacional, constituído por escudo enquadrado por volutas e formado por cinco escudetes postos em cruz, carregados com cinco besantes em aspa, com bordadura de sete castelos. Os letreiros citam a fórmula sálmica “O justo florescerá como a palma” e o título do monarca, aqui designado “João II, rei de Portugal e dos Algarves, senhor da Guiné.” O título do rei inclui o algarismo “2”, muito raro nas moedas desta época.
No século XVI, Portugal vive um período de grande prosperidade económica, fruto da sua integração nas rotas transoceânicas que, ligando a Europa, a África e a Ásia, punham em circulação produtos tão importantes como o ouro africano ou as especiarias asiáticas. “D. Manuel I, rei de Portugal e dos Algarves, d’aquém e d’além-mar em África, senhor da Guiné, da conquista, navegação e comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia” foi o rei que, com este impressionante título, o mais extenso utilizado até então, se fez representar na moeda que marca simbolicamente esta época – o português.
Batida em ouro, esta moeda capta a essência de um projeto imperial ligado à epopeia dos descobrimentos e da expansão, de que a chegada de Vasco da Gama à Índia, o achamento do Brasil por Pedro Álvares Cabral ou a conquista de Goa por Afonso de Albuquerque foram três momentos importantes. Numa face, o brasão de armas do reino representa a ideia de soberania nacional; na outra, a cruz da Ordem de Cristo mostra o papel desempenhado por esta ordem religiosa na história marítima. Moeda de grande prestígio, o português chegou a ser imitado em várias cidades do norte da Europa e foi até utilizado, devido à sua evidente carga simbólica e propagandística, como instrumento diplomático ao serviço da corte régia. A sua influência foi de tal forma grande que, já no século XVIII, também D. João V procurou recuperar a sua produção para efeitos de cerimonialização do poder régio.
Após a aclamação de D. João IV como rei, acontecimento que pôs fim a sessenta anos de domínio espanhol, Portugal teve de resolver vários problemas relacionados com a sua afirmação na cena política internacional. A Guerra da Restauração, travada ao longo de mais de vinte anos, ficou marcada por quatro desafios importantes: o reconhecimento da independência de Portugal, a legitimação da casa de Bragança como dinastia reinante, a defesa das fronteiras territoriais com Espanha e a recuperação das colónias perdidas para as Províncias Unidas dos Países Baixos no Brasil. Nesta época foi também cunhada uma nova moeda, o cruzado, com a qual o rei procurou dar resposta à necessidade de recuperar uma economia fragilizada por anos de uma prolongada guerra.
Na face primária desta moeda, vê-se o brasão de armas do reino, formado por escudo com cinco escudetes postos em cruz e bordadura de sete castelos, encimado por coroa; na face secundária, a cruz de braços equilaterais com ponto ao centro, também conhecida como cruz de São Jorge, cantonada pela data de cunhagem: 1647. A cruz evoca uma das mais antigas devoções portuguesas, ligada a episódios célebres da história nacional como a conquista de Lisboa por D. Afonso Henriques, com o apoio dos cruzados ingleses, em 1147, ou a entrega da insígnia alusiva ao santo mártir aos combatentes da batalha de Aljubarrota, entre os quais o condestável Nun’Álvares Pereira, em 1385. Nesta moeda, os letreiros correspondem ao título de D. João IV, identificado apenas como “rei de Portugal”, e ao lema “Neste sinal vencerás”, a fórmula mais frequente nas moedas que foram cunhadas pelos reis da casa de Bragança até à implantação da república em Portugal.
No século XIX, Portugal vivia um período muito importante da sua história, marcado não só pelas lutas entre liberais e absolutistas, representados respetivamente por D. Pedro IV e D. Miguel, mas também pela promulgação da primeira legislação de cariz constitucional no país oitocentista. Nascida no Brasil, D. Maria II subiu ao trono após a abdicação do pai e chegou a casar com o tio, que tinha chegado a Lisboa, vindo do estrangeiro, para jurar fidelidade à carta constitucional. Ao longo do seu reinado, o país atravessou uma grave crise económica e financeira, coeva das lutas que opuseram os grupos políticos de matriz cartista e vintista.
Ciente de que a questão devia ser sanada juridicamente, D. Maria II tentou promulgar vários diplomas com o objetivo de pôr termo à crise, embora sem ver grandes efeitos: de facto, o seu governo caraterizou-se por uma série de golpes revolucionários e contrarrevolucionários que mostram bem as dificuldades da transição do absolutismo para o constitucionalismo. Com a sua efígie foi cunhada, em 1833, esta peça de ouro, também conhecida como “degolada” devido à inusitada representação da cabeça da rainha, sem busto. Numa das faces surge o seu rosto com feições ainda jovens, com um elaborado penteado. Na outra face surge o brasão de armas do reino, com configuração tipicamente oitocentista, enquadrado por dois ramos entrelaçados. Para além da data da cunhagem, os letreiros identificam a monarca como “Maria II, por graça de Deus, rainha de Portugal e dos Algarves.” Peça emblemática desta época, a “degolada” é ainda hoje muito apreciada pelos colecionadores de moedas.
Produzido para substituir a moeda de réis cunhada na época monárquica, o escudo foi a espécie monetária que circulou em Portugal entre os inícios do século XX, data da implantação da república, e os inícios do século XXI, data do aparecimento do euro. Ao longo destes cem anos de história, o escudo conheceu vários temas e configurações, associados aos vários períodos em que a história contemporânea se divide: a Primeira República, o Estado Novo, a Democracia.
A peça que lhe mostramos na imagem, idealizada por Helder Batista, corresponde à última emissão de escudo, em ouro, antes da entrada em circulação do euro: numa das faces vê-se a indicação do valor e da denominação; na outra vê-se o brasão de armas da República Portuguesa, formado por escudo com cinco escudetes postos em cruz, carregados com cinco besantes em aspa e enquadrados por bordadura de sete castelos. No local onde, nas moedas da época monárquica, surgia a coroa, aparece agora um nó de corda que evoca um dos motivos mais comuns na arte portuguesa do período manuelino, intimamente ligada ao tema do mar e da navegação. Os letreiros identificam a autoridade responsável pela emissão e a data em que esta ocorreu: 2001. Embora a sua produção tenha sido interrompida nesta altura, a moeda continuou a circular ainda durante alguns anos, até ser recolhida por ordem do Banco de Portugal.
A criação de uma moeda única no espaço europeu foi um momento muito importante na história da União Europeia e dos países que a integram, entre os quais Portugal. A produção desta moeda é um desafio que está a cargo de muitos artistas e técnicos que trabalham diariamente em colaboração com as várias casas da moeda europeias. Nas suas denominações, o euro apresenta uma face comum a todos os países da União Económica e Monetária e uma face nacional específica de cada país: Luc Luycx foi o autor do desenho alusivo ao mapa da União Europeia com as doze estrelas da bandeira, e Vitor Santos, o autor do desenho alusivo aos selos de D. Afonso Henriques, com as quinas e os castelos que formam o brasão da República.
Em Portugal, a primeira moeda de euro, já em ouro, foi produzida um ano depois da entrada da nova moeda em circulação, assinalando uma data muito importante da história filatélica portuguesa: os 150 anos da emissão do primeiro selo. Este selo foi produzido durante o reinado de D. Maria II, em 1853, e é hoje um objeto muito cobiçado por todos os colecionadores filatélicos, devido à sua grande raridade e valor histórico. Nele, a rainha fez-se retratar à esquerda, com um diadema na cabeça e cabelos presos num delicado penteado, à moda das elites do século XIX. Acima da efígie da rainha, pode ler-se a palavra “Correio”, uma instituição que foi criada nos inícios do século XVI e que ainda hoje se mantém ativa, cumprindo a sua missão de assegurar soluções de comunicação, logística e produtos financeiros baseadas na inovação e na confiança.